A derrubada de mais um casarão no Centro histórico da cidade na calada da noite e férias forense evidencia a necessidade de se ter na prática a política municipal de proteção ao patrimônio material e imaterial, com efetiva condução da administração municipal. O problema não é a falta da lei, mas o respeito à que já existe há quase dez anos para contemporizar essa polêmica que não é própria só de Araxá.
É nítida a divisão de radicais opiniões, a de substituir o antigo pelo moderno guardando a memória apenas na gaveta ou a de impedir qualquer demolição de imóvel com antigas características. Isso ocorre até pela falta de conhecimento da lei existente que estabelece as regras e impede a demolição apenas da fachada de imóveis tombados que interferem na paisagem urbana e estão na memória popular. Já os imóveis inventariados podem ser demolidos e somente constar nos históricos registros públicos. A história de um povo não pode ser tratada com extremismos, porque o risco de acontecer aculturamento e perder a sua identidade é muito grande. Assim como não se pode impingir o ônus dessa proteção e preservação à iniciativa privada sem a adequada contrapartida.
Hoje, a lei estabelece isenção de IPTU de imóveis inventariados, mas poucos proprietários sabem deste benefício que ainda é insuficiente diante da cara manutenção. O casarão da av. Antônio Carlos que pertenceu à tradicional família do maestro Elias Porfírio de Azevedo e abrigou o Memorial de Araxá por mais de uma década estava apenas inventariado, embora o seu valor material e imaterial. Então, a priori esse imóvel poderia ser demolido conforme os trâmites legais com alvará emitido pela prefeitura. No entanto, mais uma vez preferiram ignorar e agir à margem da lei. Falta o bom exemplo da administração municipal que não tem protegido e preservado os imóveis de interesse público no decorrer dos anos inclusive os do próprio patrimônio, assim como o do Estado que deixa relegado o Complexo do Barreiro.
O município foi pioneiro no cumprimento dos quesitos para receber a fatia do ICMS estadual do património histórico e cultural ainda na gestão do ex-prefeito Olavo Drummond (1997/2000), mas esta política pública foi desmantelada com o passar do tempo. A atual gestão que retoma essa política deve dar ênfase na conciliação da história e o progresso, o que está exemplificado não só na Europa como em municípios mineiros considerados turísticos justamente pelo cuidado com a sua cultura e patrimônio.
Araxá tem um recente bom exemplo que é a construção de um edifício na av. Imbiara que preserva a fachada do histórico casarão que abrigou a Secretaria Municipal de Educação. No entanto, mesmo com a reativação do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural (Compac) e reestruturação do Instituto de Planejamento e Desenvolvimento Sustentável (IPDSA) continua iminente o risco dos poucos imóveis restantes que deveriam ser tombados pelo município virem abaixo na calada da noite. Para avançar, é preciso que o município defina quais são de fato os imóveis de interesse público a serem protegidos e buscar os seus tombamentos com o devido respeito à propriedade privada. O ideal seria adquiri-los, restaurá-los e dar-lhes uma destinação que vai justificar a sua existência.
Um dos históricos casarões que está na iminência de vir abaixo abriga uma importante área verde no coração da cidade. Enquanto prevalecem desconhecimento e omissão de todas as partes, não só acontecem imprevistas demolições de bens de valor histórico de propriedade privada como outros estão para cair a exemplo do prédio da antiga Pensão Tormin que de fato foi construído por Anna Jacintha de São José (Dona Beja). O exemplo não vem de cima à medida que o poder público não cuida do próprio patrimônio histórico e cultural que também está deixando ir embora como o antigo Hotel Colombo e Igrejinha no Barreiro.